sábado, 14 de abril de 2018

16.

Victoria acordou no dia seguinte com um raio de sol em seu rosto. Assim que abriu os olhos ela não lembrava de onde estava, mas aos poucos recordou a noite anterior. Ficou um tempo parada por medo de tudo aquilo ser apenas um sonho. Caso fosse, ela não gostaria de nunca mais acordar.

Luciano a beijou. Beijou apaixonadamente, intensamente, de maneira que ela não pode, nem quis dizer não. A única alternativa para ela foi se entregar àquilo que estava latente em seu coração há muito tempo. Coração este que ainda estava batendo descompassado, mesmo depois de ter tido a melhor noite de sono em anos.

Quando se amaram, ele a tocou delicadamente. De maneira que fazia seu corpo todo se arrepiar. Luciano sabia de quase tudo que Victoria havia passado nas mãos de seu ex namorado e não queria repetir todo aquele drama. Ele a tocava. E todas as vezes que isso acontecia, ela respirava fundo, fechava os olhos e se perdia em sensações a muitas esquecidas.

Ela se deixou conduzir por ele. Pelos beijos, braços e mãos em seu corpo. Dos sorrisos, dos olhares.... Os beijos eram protetores. Românticos e apaixonados. E ela se viu querendo mais. Sabia que logo ficaria viciada neles. Aquele não era o momento certo. Eles estavam lutando contra um dos demônios mais poderosos que ela já teve conhecimento... Logo Victória afastou esse pensamento, balançou a cabeça para afastá-los. Àquela hora, ela só queria se lembrar do homem que estava deitado ao seu lado dormindo. Homem este que a amara como ninguém havia feito antes.

Parada na cama, com uma fina coberta, olhou para a janela. A cortina estava deixando passar um único raio de sol e ela se sentiu plena novamente. Sentiu braços envolta dela. Ele ainda estava dormindo e ela não queria acorda-lo sem motivo. Preferiu ficar ali parada quanto tempo fosse necessário dentro daqueles braços que lhe passavam segurança. Tentou gravar todo e qualquer detalhe que via. Notou que os braços dele eram fortes, não da maneira feia, não eram grotescos, mas naturalmente fortes. Protetores. Notou também algumas cicatrizes. Provavelmente das lutas ao lado dela. Victória suspirou.

Ela sentia a respiração lenta e gradual em seu ombro. Lentamente, Victoria virou-se para Luciano. Ele dormia tranquilamente e ela se encostou em seu peito e ficou ali escutando o som ritmado do coração que a fez perder a noção do tempo.

Mas Victoria precisava se levantar. Estava faminta. Na correria esqueceu-se de comer alguma coisa. Esqueceu, inclusive, de ligar para Antônio para avisar que ambos estavam bem. Lembrando-se disso sorriu. Pensou em André e em como ele iria ficar louco quando soubesse. Será que ele iria se zangar com ela? Victoria balançou a cabeça novamente. Depois pensaria nisso. Agora ela precisava se levantar para comprar um café para dois. Ela suspeitava que aquele apartamento não tivesse nada de comida.

Mas sempre que olhava para Luciano esquecia de tudo. Aquele ritmo lento e gradual de sua respiração a fazia perder qualquer sentido de responsabilidade. Ela sabia que ele sempre fora um perigo para ela, mas jamais soube, ou percebeu, que ela o amava. O amava profunda, completa e intensamente. E agora estava exposta. Isso a fez ficar insegura. Lembrou-se de tudo que passou com o Danilo. Balançou novamente a cabeça tentando apagar tais lembranças. Aquele momento, aquela noite não mereciam que ela trouxesse fantasmas do passado.

- Se você continuar me olhando assim, jamais vou deixar você se levantar dessa cama de novo. – Ele falou de forma rouca beijando sua testa. Victoria se arrependeu de ter se mexido.
- Desculpe ter me mexido. – Ela falou baixo como se tivesse medo que ele sumisse de repente.
- Não se preocupe, eu ficaria aqui para sempre se fosse possível. – Ele falou com aqueles olhos castanhos olhando intensamente para ela.
- Estava pensando se você não está com fome, porque eu estou faminta. Como você está? – Victória perguntou passando a mão nos fartos cabelos dele.
- Minha cabeça ainda dói, confesso, mas acho que deve ser por não ter comido nada e por tudo mais. – Ele ficou calado por um tempo apenas sentindo o cheiro dos cabelos de Victoria. – Fico me perguntando repetidas vezes como Malak foi capaz de nos enganar daquele jeito. Como não notamos que...
- Não pense nisso agora. Primeiro temos que comer alguma coisa, depois pensaremos nisso. Ainda estou preocupada com você.
- Eu estou pensando mesmo é naquele diário. Vic e se eu...
- Pare. Não vai acontecer nada com você. Eu prometo. – Victoria nem mesmo sabia se ela acreditava naquelas palavras.
- Sabe... Gostaria de que eu pudesse te proteger de vez em quando! – Ele falou olhando dentro dos olhos dela. Aqueles cálidos olhos castanhos que tanto o fascinavam. Ele notou que seus olhos tinham tons de cores diferentes. O direito era mais claro que o esquerdo. Luciano sorriu. – Você tem Heterocromia? Como numa percebi isso?
- Quase ninguém percebe! Não se preocupe. – Victoria falou sorrindo. – Vem, vamos tomar banho para irmos tomar café. Ainda temos que avisar a todos que estamos bem.

Victoria e Luciano se amaram mais uma vez antes de irem tomar banho. Nenhum dos dois estava querendo sair daquela cama. Ambos tinham medo de que tudo aquilo fosse apenas um sonho e que, ao se levantar, tudo iria desaparecer. Depois de devidamente tomados banhos, saíram para comer alguma coisa. A sorte era que o apartamento ficava próximo de várias padarias e àquela hora já estavam apinhadas de gente.

O tempo que ficaram juntos estavam sempre de mãos dadas. Todos que passavam por eles sorriam. Victoria sentia uma energia positiva emanando de todos que estavam ao redor deles. Parece que aquela filosofia de que o mundo reage a você quando demonstra leveza e felicidade era verdade. Victoria suspirou. E foi um suspiro de medo, pois ela sabia que todas as vezes que ela se sentia completamente feliz, acontecia alguma coisa que estragava isso.

Os dois chegaram juntos ao colégio, e como ainda era muito cedo, não havia ninguém. Eles puderam andar livremente pelas instalações do colégio sem ter que dar satisfações para ninguém. Luciano, apesar de ter ficado um pouco chateado, entendeu quando Victoria pediu um tempo para se sentir confortável para contar a todos que eles estavam juntos. Ele sabia que não era fácil para ela, mas.... Não conseguia compreender. Não completamente. Ficava pensando se ela o estava comparando-o com Danilo. Ele preferiu não pensar nisso, senão teriam a primeira briga antes mesmo de sequer pensar em começar alguma coisa.

Ao entrarem na sala de Victoria, Luciano segurou a mão dela e a puxou para um beijo. Ela se deixou envolver em seus braços, mas logo se lembrou onde estavam. Delicadamente ela se soltou sorrindo.

- Não havíamos combinado que...
- Não tem ninguém ainda no colégio. É um beijo e não um crime. – Luciano falou entre beijos. – Abriremos para os outros quando você estiver confortável. – Ele falou olhando para ela.
- Obrigada! – Ela falou baixo, mas Victoria sentiu que ele estava querendo falar alguma coisa. – O que foi?
- Há uma pessoa que teremos que contar antes de todos.
- Lu... – Victoria falou se soltando.
- Ei... Eu dei permissão para você sair do meu abraço? – Ele falou rindo. – Vic, ele precisa saber. – Ele voltou a olhar dentro daqueles olhos castanhos de cores levemente diferentes. Para Luciano era o mesmo que estar olhando para o paraíso. – Você, como sempre, está sendo teimosa. Eu sei que você está louca de vontade de contar tudo para ele. De conversar com ele. – Ele falou abraçando Victoria no momento em que Antônio e Moises entram na sala.

Antônio notou que aquele abraço estava diferente dos outros que ele já havia presenciado entre os dois. Victoria estava com um semblante calmo e iluminado. Aparentemente parece que ambos aceitaram seus verdadeiros sentimentos. Ele se sentiu feliz por ambos. Ele se sentia o pai deles e ficou feliz em saber que eles estavam felizes.

- Luciano, meu filho, você apareceu! – Ele falou tentando mostrar normalidade. Notou que logo eles se separaram.
- Nós estávamos preocupados com você. Onde você estava? – Moisés perguntou alheio ao que estava acontecendo dentro daquela sala.
- Passei a noite no apartamento de um amigo meu. Precisava pensar direito em tudo que está acontecendo ultimamente.
- E você filha? Está abatida.
- Eu passei a noite procurando por ele, padre. Ele só foi me ligar hoje de manhã.
- Eu cheguei tem uma meia hora, estávamos conversando...
- Estávamos brigando na verdade. Disse para ele nunca mais fazer isso de novo. – Victoria falou tentando fazer com que aquele sorriso no olhar de Antônio sumisse.
- Ah, Luciano, o André quer falar com você. Ele disse que precisa esclarecer muitas coisas que você não deixou ao sumir daquela forma. Eu recomendo que você vá, filho. A ignorância é a arma do demônio. Ele usará isso contra você.... Contra vocês dois. Vá falar com ele, sim?
- Tudo.... Tudo bem. Eu prometo não demorar. – Luciano falou segurando forte a mão de Victoria. Saiu antes que não conseguisse segurar mais a imensa vontade que estava em beijá-la novamente.

Quando Victória se viu sozinha ficou pensando quão exaustivo é o treinamento com André. Ela mesma passou por ele quase desistindo. Luciano ter uma conversa franca com ele antes de começar era uma boa ideia.

Uma conversa com André.... Isso estava tirando a paz dela. Ela sabia que precisava conversar com ele sobre muitas coisas, mas não sabia como se comportar perto dele. Victoria sempre quis um pai, e quando encontrou... O encontrou doente. Victoria ficou olhando para uma imagem de Jesus por alguns minutos. Ao ouvir os primeiros sinais de que as aulas estavam para começar respirou fundo e foi fazer suas atividades diárias.

Antônio havia saído com Luciano e Moisés voltou para o ginásio. Hoje seria o dia em que ele começaria o dia conversando com os alunos. Depois de tudo que aconteceu, os pais acabaram ficando um pouco mais com seus filhos para sempre escutar o que ou o padre ou o pastor tinha para lhes falar. Geralmente eram coisas livres de religiões. Pregava-se o respeito e tolerância. Victória achava importante nesses tempos em que atentados terroristas estavam acontecendo em boa parte do mundo. Hoje Moisés falaria sobre Orlando. 

O dia seria longo, mas Victória estava renovada. E com esperanças. Ela precisaria disso logo mais

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