quinta-feira, 23 de junho de 2016

13.

Luciano estava inquieto dentro da igreja. Não sabia o que estava acontecendo lá fora com as crianças nem com Victoria. Ele ficava cada vez mais preocupado. Se virou para olhar para os alunos. Alguns estavam quietos rezando num canto. Outros tentavam falar com os pais. Outros conversavam baixo.

 Antônio vinha de tempos em tempos trazendo coisas para as crianças comerem. Luciano suspirou. Ele não queria deixar Victória sozinha numa hora dessas, o pior foi que ele havia esquecido sua bolsa, estava com poucos fracos no bolso. Logo ele que sempre estava com ela. Mas também não poderia deixar aquelas crianças sozinhas. Ele era responsável por elas no momento que elas passavam pelos portões do colégio.

Quando começou com tudo isso, sabia que as coisas poderiam ficar mais perigosas, mas agora, estava afetando crianças. Quando se formou em matemática e física, tudo que ele queria era poder passar o que entendia para crianças de modo que elas entendessem. Ele gostava de dar aulas, gostava das suas turmas, gostava da agonia de corrigir provas e testes e trabalhos. E principalmente gostava de conversar com elas. 

Crianças, na maioria das vezes, possuíam um olhar diferente de tudo. Elas enxergavam a verdade antes mesmo de os adultos sequer pensarem haver outras possibilidades. Foi um de seus alunos que abriu seus olhos sobre seus sentimentos em relação a Victoria. Crianças eram especiais.

Agora essa... Coisa estava afetando as duas coisas que ele mais amava na vida: as crianças e a Victoria. Uma raiva começou a crescer dentro de Luciano. Uma raiva que ele não sabia de onde surgiu, mas que tinha alvo certo. Malak. Ele odiava aquilo que ele estava fazendo com sua preciosa cidade. Odiava o fato de ele ter voltado e odiava principalmente quando ele enfrentava tão abertamente Victoria, deixando-a insegura.

Ele respirou fundo. Não podia explodir agora. Não na frente das crianças. A última vez que fizera isso, precisou chamar um marceneiro para consertar a porta do armário de seu quarto. Ele se lembra do quão assustado ficara no momento que vira a porta do armário completamente destruída depois do acesso de raiva. Então veio o sorriso de Victoria na sua memória. Um sorriso que nem ela mesmo novata. Sorriso cada vez mais raro. Um sorriso cálido, aconchegante. A raiva começou a diminuir rapidamente. Sua respiração começou a voltar ao normal.

De onde estava, viu Antônio se aproximando. Suas feições estavam preocupadas, e ele soube que não ficaria na igreja por mais tempo. Enquanto isso contabilizou novamente seus frascos, não chegavam nem perto do que ele sempre levava consigo. Maldita hora de deixar a bolsa no carro. Mas, aqueles precisavam servir para alguma coisa. Ele assim esperava. 

- Você vai voltar para ajudar Victoria. – Antônio não estava fazendo uma pergunta.
- Eu não posso deixá-la sozinha no meio de tudo isso.
- Você a ama tanto assim? – Antônio perguntou sem cerimônia.
- Sim... Não... Quer dizer... – Luciano parou quando viu o olhar complacente de Antônio para ele. Ele apenas suspirou. – É tão óbvio assim?
- Aparentemente somente ela não aceitou a verdade.
- Victória pode ser teimosa na maior parte do tempo. Eu não posso chegar para ela no meio de tudo isso e jogar uma coisa dessas para cima dela. Ela me afastaria. E se isso acontecer...
- Seu coração se parte em pedaços. – Antônio falou colocando a mão no ombro de Luciano. – Luciano, posso ser padre, mas tive meus namoricos quando adolescente. Sei o que você está sentindo por ela. E sei o quanto isso é forte. Essa ligação que vocês dois têm... É a arma secreta de ambos. Vocês vão precisar dela. Quando chegar o momento da verdade.
- Que verdade?
- Cada coisa tem sua hora. Agora ela.... Quem é aquele no meio da fumaça? – Antônio desviou seu pensamento quando viu uma figura, uma forma humana no meio da fumaça. – Será que é um aluno? Ou algum professor perdido? Acho que é aquele novo professor.

Luciano reconheceu aquela figura quase instantaneamente. Ele sempre achou Paulo esquisito, mas não imaginava que ele fosse estúpido. Novamente a raiva na boca de seu estômago. Luciano detestava pessoas idiotas, e desde o momento que conheceu Paulo, classificou-o como uma pessoa idiota.

Paulo estava parado no portão, ainda olhando para o escritório de Victoria. Ele estava lá algum tempo. Na verdade, desde que a fumaça tomou todo o colégio ele estava parado lá, mas ninguém notou, pois todos estavam preocupados com as crianças. Na verdade, a fumaça ficou mais pesada no colégio assim que Paulo foi para o portão. Ele estava calmo, encostado no muro com os braços cruzados.

Da igreja Luciano ficou chamando por ele em vão. Paulo escutava perfeitamente o chamado preocupado de Luciano e era isso mesmo que ele queria. Chamar a atenção do guarda-costas de Victoria. Ele teria que ser eliminado primeiro. Ordens de Malak. Luciano era uma força com a qual Malak não tinha condições de lutar. Não ele propriamente falando, pois Malak notara um ponto escuro em sua alma, mas a força que ele carregava em seu coração. Uma força mais antiga do que qualquer coisa que Malak tinha conhecimento. A força mais forte que os humanos foram capazes de criar. O amor. E contra ele nenhum ser do submundo poderia ser capaz de lutar.

Paulo ficou ali, parado, de óculos escuros e sua característica camisa polo dois números maiores, encarando o vulto de Victoria quando Luciano se aproximou dele. O rapaz não reparou, mas Paulo esboçou um sorriso que afastaria até mesmo o mais perigoso fugitivo.

- Paulo, cara, o que você está fazendo sozinho nessa fumaça? Vem, vamos nos proteger dessa fumaça. – Luciano falou chegando perto dele.
- Você... É uma distração que meu mestre simplesmente não quer mais.
- O... Quê? – Luciano se virou para Paulo a tempo de ver o fogo vermelho de Malak envolvendo o professor.
- Você... Vai ser eliminado! – Paulo tirou os óculos e olhou direto nos olhos de Luciano. Tudo ficou escuro ao redor dele.

Victoria apareceu na janela a tempo de ver Luciano caindo no chão e Paulo rindo. De onde estava, Paulo não pode escutar os gritos de Victoria para eles. Paulo apenas olhava para Luciano caído. Sua missão estava completa. Seu mestre agora poderia ficar feliz, afinal.

 O guarda-costas de Victoria, havia sido eliminado.

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